A pluralidade da classe trabalhadora: Luta diária contra a LGBTfobia e outras opressões

Jhon Soares – Militante LGBT

 

 

Em 28 de junho, comemora-se o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (orgulho das pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queers, Interssexuais, Assexuais e outras expressões da sexualidade e diversidade de gênero, divergente da heterossexualidade padrão).

A data relembra a Rebelião de Stonewall que aconteceu em 1969 em um bar situado em Nova York/EUA, onde cansados de tanta repressão policial e preconceito, centenas de LGBTs marcharam em grandes manifestações pedindo respeito e dizendo em alto e bom tom: “nós existimos”.

Após 53 anos é inegável dizer que houve avanços em vários países, houve: casamento civil igualitário, liberdade de ir e vir e adentrar espaços públicos e privados, direito ao emprego formal, representação não caricata no cinema, na TV, no teatro, etc. Ainda assim, precisamos reafirmar o orgulho e manifestar o acesso a direitos humanos fundamentais: civis e políticos.

Contudo, a questão é mais complexa do que apenas “dar” direitos a comunidade LGBTQIA+, é necessário entender de onde surge as opressões e a quem elas favorecem.

Vivemos em mundo capitalista, explorador da força de trabalho de bilhões de mulheres e homens e que devasta a natureza e o meio ambiente, em prol dos enormes lucros das multinacionais, conglomerados empresariais e dos bancos multimilionários que pertencem a poucas e poderosas famílias do mundo.

Apenas a exploração da mão de obra não seria capaz de perpetuar o poder na sua forma mais bruta, foi necessário que esse sistema desenvolvesse outro mecanismo: uma ideologia que dividisse a classe trabalhadora em outras categorias sociais, ao causar a sensação de não pertencimento a um “todo comum”, seja pelas necessidades básicas da vida, seja pelas aspirações ao futuro.

A disseminação da ideia de que nossas especificidades e necessidades particulares nos divide. A exploração perpassa pelo aspecto do trabalho: pelo nível salarial, pela formação escolar-acadêmica, pelo regime de trabalho (RJU, Celetista, terceirizado), pela técnica empregada na realização do serviço: braçal ou intelectual. A opressão ocorre pela diferenciação da cor da pele, do gênero, da sexualidade, da região em que nascemos, pelas condições físicas do corpo e da mente.

A sobreposição entre exploração e opressão remonta um quadro crítico: aqueles que são mais explorados ao ocuparem os piores setores da economia, ao receberem os piores salários, ao terem as piores condições de trabalho, e consequentemente as piores condições materiais de subsistência da vida. Quanto mais explorado é o trabalhador, mais difícil sua possibilidade de se enxergar como um, mais difícil ainda sua organização em entidades sindicais e associações de categoria. Ele se sente só e sem perspectiva de futuro.

A opressão é resultado das condições históricas e materiais da sociedade, no Brasil foram mais de 330 anos de escravização legalizada do povo negro e afro-brasileiro. Fazem 90 anos que as mulheres conquistaram o direito ao voto e a participação na política, e apenas em 2013 o casamento civil igualitário a casais homoafetivos foi aprovado. Esses mecanismos, produzem “corpos dóceis” (Michel Foucault), indivíduos submissos ao micro poder e a disciplina, proibidos de se rebelarem e fadados a trabalharem até morrerem.

A violência de gênero e racial e o preconceito com a diversidade sexual, aprofundam e escancaram o que há de mais ofensivo: a coerção e a violência direta contra o corpo, querem controlar nossas identidades e existência.

Não negamos as particularidades das diversas categorias da classe trabalhadora, a heterogeneidade é intrínseca a nós pois compomos os 99% dos desapossados do mundo – aqueles que vivem do trabalho ao vender sua força produtiva. Por obvio, somos plurais, e a pluralidade tende a ser democrática.

Ângela Davis, Lelia Gonzales e bell hooks – militantes e intelectuais negras – debateram a questão da “interseccionalidade” entre raça, gênero e classe, e o papel revolucionário das mulheres negras fronte as mazelas do capitalismo.

E se toda a história da civilização humana é a história da luta de classes (Marx e Engels), façamos um exercício diário de compreensão da realidade: a insterseccionalidade dentro das opressões, não deve nos dividir, e sim nos unir numa luta diária contra as opressões e as desigualdades sociais, fazer da sociedade um lugar menos injusto.

Para tanto, conquistar uma democracia plena, que reconhece o outro e o inclui como um ser dotado de direitos, é uma tarefa árdua, que requer de nós o papel de sermos antirracistas e anticapitalistas. Um processo dialético: 1) Uma tarefa individual: reconhecer através da autocritica os privilégios de raça, gênero e sexualidades normativos (homens, brancos, héteros, etc), 2) uma tarefa coletiva: e de reconhecermos que somos todos trabalhadores, plurais e diversos e portando devemos nos educarmos numa perspectiva da pedagogia do oprimido (Paulo Freire): uma educação libertadora e inclusiva, através de debates e formações políticas, sobre as opressões e os papeis que cada um ocupa na sociedade.

Nós LGBTQIA+, ainda sofremos muitos preconceitos, em nossas casas, nos nossos locais de trabalho, na rua: seja através de piadas, de coerção física e emocional, de assédio moral, de negação da nessa sexualidade e representação da nossa afetividade, um simples beijo gay/lésbico ainda incomoda muita gente. Inúmeras irmãs travestis e transexuais são assassinadas todos os anos, simplesmente por existirem.

Façamos de nossa classe, um lugar de aconchego e acolhimento, com empatia e inclusão. Que a diversidade seja democrática.

Stonewall vive. Liberdade para expressar sua identidade e essência. Toda forma de amor e afeto é justa e bem-vinda. Derrotar o governo LGBTfóbico de Bolsonaro nas ruas e nas urnas.

28 de junho de 2022