JANEIRO BRANCO: A HIPOCRISIA DOS PATRÕES EM UBERLÂNDIA

 

Relato de uma trabalhadora da saúde

 

O janeiro branco é uma campanha pelo cuidado em saúde mental criada em Uberlândia, e posteriormente nacionalizada, com o intuito de, segundo o site oficial: “chamar a atenção da humanidade para as questões e necessidades relacionadas à Saúde Mental e Emocional das pessoas e das instituições humanas”.

De modo geral, nesta época do ano, as empresas realizam palestras, rodas de conversa, dinâmicas, brincadeiras, adentrando na campanha e na discussão da saúde mental dos seus trabalhadores e trabalhadoras.

Tratando-se especificamente da área da saúde em Uberlândia, trabalhadoras e trabalhadores vêm enfrentando um exaustivo período de combate ao COVID-19, perdendo suas vidas no enfrentamento à doença e foram noticiadas ações das mais diversas.

Poderíamos pensar que é uma conquista o fato de que os patrões estejam dispostos a fazer algo pela nossa saúde, mas quando olhamos mais de perto, muitas vezes as ações realizadas nos colocam em situações vexatórias com dinâmicas infantilizadas ou de cunho religioso, constrangimentos a expor questões íntimas sem garantia nenhuma de sigilo, nos poucos casos que são conduzidas por psicólogos muitas vezes são pessoas da mesma equipe, contrariando os princípios da ética da psicologia. Mas esse é apenas o começo da mais pura hipocrisia.

Trabalho com equipes reduzidas e com baixíssima quantidade de profissionais por quantidade de habitantes, locais de trabalho insalubres, sem computador e outros equipamentos necessários ao trabalho, salas sem janelas e/ou ventilação inadequada, falta de EPI’s adequados, falta de acessibilidade, falta de saídas de incêndio, locais de descanso inadequados, constrangimento e assédio aos trabalhadores que se afastam por motivos de saúde, demissões após afastamentos prolongados por questões de saúde mental, redução do tempo de afastamento por síndromes gripais, perda do vale-refeição caso pegue atestados, metas impossíveis, tempo de atendimento insuficiente, falta de autonomia nos processos de trabalho, desvio e acúmulo de função, não reposição do quadro de funcionários e manutenção de pessoas com histórico de assédio em cargos de gestão. Esses são alguns dos itens na longa lista de problemas que enfrentamos no nosso dia a dia.

No Hospital de Clínicas especificamente, a campanha do Janeiro Branco é noticiada nas redes sociais para fazer bonito. Além de questionar o quanto um plantão psicológico com atendimentos pontuais representa no tratamento à questões de saúde mental, questiono as demissões do dia para a noite de pessoas que trabalharam por toda a vida juntas, as dificuldades em garantir a sobrevivência em que não se fala, os casos de adoecimentos graves em decorrência de situações que ficam escondidas. Qual a saúde possível para seus trabalhadores e trabalhadoras, HC UFU?

Tenho a certeza que você, trabalhadora e trabalhador da saúde de Uberlândia, ao ler esse texto, se identificou com muitas situações aqui descritas. Agora pergunto, qual é a real condição para uma verdadeira saúde mental se não condições de trabalho adequadas? Segurança que irá ter o que comer e onde morar para você e para sua família? Condições de se cuidar sem a ameaça ao desemprego?

Este texto é uma denúncia e um convite. Não há possibilidades de uma verdadeira saúde mental sem condições de trabalho dignas. Só a luta muda a vida, camaradas, sigamos firmes na luta!

 

25 de janeiro de 2022